Lambe Lodo Records apresenta: "Bigode de Leite"
Concepção, músicas, letras e produção por Bruno Fleming.
Bruno Fleming "Algumas horas foram tão bonitas que queria apenas tocá-las de novo cristalizadas transformadas em bolas de natal mesmo que desbotassem com o tempo uma vez por ano eu as teria penduradas. Enfeite, deleite"
por Paula Lombardi.
BIGODE DE LEITE
DISCO 01 - SEMENTE DE ROMÃ
BIGODE DE LEITE
DISCO 02 - SEMENTE DE ROMÃ
DOWNLOAD SEMENTE DE ROMÃ: http://www.mediafire.com/?lb6a71pfo3nc605
DOWNLOAD FOLHA DE HORTELÃ: http://www.mediafire.com/?wb54ww5ncbqsawk
SEMENTE DE ROMÃ
Foi1 em dia de chuva. Dona Chica
inda nem tinha rugas!
Meio-dia dourado. Seu Sebastião inda era
soldado!
(A
Vizinhança): - Viva Dona
Chica! Nove meses, é menino ou é menina?
É vida nova.
Vespertina brisa soprava da janela sorte pra
barriga da mãe.
Mil novecentos e preto e branco...
(A
Família): - Bebê, seja bem
vindo ao teu lugar!
(O
Porteiro): - Tua cidade tem
ruas de grama!
Noite de enxurrada, num barco de papel veio a
vizinhança.
Era noite de (fé) festa! Um brinde para os pais
e palmas para ela, a mãe.
Mil novecentos e preto e branco...
(O
Doutor): - Bebê, seja
bem-vindo ao teu lugar!
(O
Bêbado Amarelo): - Tua
cidade tem ruas de grama!
Veio menino a respirar.
De bucho azedo e nome Totó!
Tão pequenino em berço de quem deita tranquilo
pro sonho que vem.
E2 assim ele nasceu: amarelo,
magrelo, pulmão de aço e contente, banguelo e sorridente.
(Seu
Sebastião): - Fixos os
olhos, é tudo seu: Vó Sinhá, Tia Anita e Tio Dirceu!
E assim ele cresceu, bem vermelho o
cabelo, dente torto e chorão quando alguém falava não!
E a tal cidade é linda e minha!
Avenidas
pra correr descalço a pisar em grama de nascer pomares pra deitar.
E assim ele viveu, azulado na vida, cheio de
entusiasmo, aprendendo com o acaso.
(Dona
Chica): - Fixos os olhos, é
tudo seu: Seu Garcia, Túlio e Matheus!
E a tal cidade é linda e minha!
Um
grande abraço em você é casa boa pra ficar, é amizade de saber quando é pra
cuidar.
Bairros tão familiares, prédios que me lembro
bem da arquitetura de morar um sonho mais além.
Quando a amizade é linda e vinga, tudo3
fica melhor, o mundo fica melhor.
Tudo vira tinta pros olhos de Totó. (Pintura em
movimento).
Porque dar as mãos é importante, e olhar nos
olhos é bom para ver o outro.
O meu olho é meu pincel quando passarinho.
Minha tela é minha vida se contigo.
Quanta tinta em nossos dias cara amiga, cidade
minha.
(Totó): - a-e-i-o-u...
O olhar de criança desenterra esperança daquilo
que ela olha.
O olhar de criança criará esperança naquilo que
ela pintar com os olhos.
Naquele4 tempo, o tempo é que
esperava pela hora do menino de dizer.
Ele escolhe, ele é o rei!
Naquele tempo os anos se contavam pelas cores
dos aromas que pairavam no ar.
(Totó): - Mamãe, papai! Já sei falar e ler um pouco!
Aquele tempo é agora quando eu relembro como
era bom viver.
Tempo-mundo! Viver é melhor que sonhar, sonhar
é melhor que viver.
(Totó):
- Não sei olhar no relógio
não, e meu velotrol é muito massa!
Tenho quatro
anos e já sei comprar pão! Vô Geraldo me dá balas de brinde!
Correr sem pressa pra buscar o pão, porque o
bom é o correr!
Demorar no banho pra virar herói!
(Totó): - Ninguém destrói o “menino-peixe”!
E viva o tempo amigo!
(Totó): - Se minha bola cai no quintal de Bebé, tenho
muito medo de pedir de volta...
Bebé é bruxa!
Domingo à tarde, passeio de balão!
(Totó):
- Zé Canarinho leve-me
contigo para as nuvens de algodão!
Um segundo pra dizer:
(Totó): - Amo vocês!
E a vida inteira vai bem!
É devagar que eu vou lá visitar a mim mesmo e
dizer: viva o tempo amigo!
Daquele mundo tiro o meu sustento, perco o medo
e o receio de continuar
meu
trabalho de fazer eu menino crescer bem.
E5 pra crescer vamos lembrar Seu
Veludo Pasteleiro
em canção de cantar saudade carimbada em meu
peito.
E que canção é essa? Quanto tempo sem você...
(Totó):
- Boa noite Seu Veludo!
Hoje tem pastel de quê?
Depois6 de dez pastéis, nove
caçulinhas, oito, sete, seis, cinco, quatro, três, dois puns...
Vamos para o parque passar mal no carrossel e
no bate-bate de latão!
No parque do Seu Quis os brinquedos são de
ferro-velho,
parafusos e chassis, rodas tortas, pinos e
pregos...
(Totó):
- Papai já virou Sargento e
me leva em seu ombro, e mamãe pelas mãos, através do reino da sucata do Sr.
Quis das ferrugens coloridas dentro do caos que ele organiza com seu lindo dom.
No parque do Seu Quis tudo é de ferro-velho.
Todas as crianças pedem bis com medo do Bêbado
Amarelo.
O7 Bêbado Amarelo conta um bolo de
dinheiro velho...
(Totó):
- Me esconde dele!
(Seu
Guarda): - Ladrão, se renda
já!
Que pena que
te viram fugindo e chorando, levante do chão!
Para o ar
além, vai bem! Rastejante (tão sujo), me dê a mão!
Haverá mais
alguém que te queira bem.
E estará em pé
também!
Sol a pino e asa-delta voando sobre teu chapéu!
Papagaio e rabiola no céu!
Ultra-leve lá de cima faz chuva branca de
papel! Mas que beleza!
Um avião desenha lá, lindos riscos no teto do
céu donde caem pingos e donde erguem bandeiras
cantando seus hinos: besouros, grilos e
abelhas...
(Seu
Guarda): - Para o ar além
vai bem! Rastejante (tão sujo), me dê a mão!
Haverá mais
alguém que te queira bem. E estará em pé também!
Em plena segunda-feira o Amarelo e a cerveja
nem8 imaginam que o ar já pesa.
Nem imaginam que os jornais já rezam os rumores
das ruas, e os cochichos das velhas
anunciando que entraremos em guerra, pelo céu e
pelo mar.
Pela janela Vô Geraldo assovia: é hora de
voltar pra dentro de casa!
(Totó): - Ei pai, que guerra é essa? Ei mãe, que
guerra é essa?
Nem imaginam que já há uma carta que vem
convocar Seu Sebastião pra guerra!
E as crianças trancadas, e os poetas em fardas
anunciando que o dia trará trevas e lágrimas;
soldados
janotas em polichinelo escorrendo o nariz, lutarão pelo país...
(Totó):
- Bebé, que guerra é essa?
Zé Canarinho, que guerra é essa? Ontem lá em casa na família tudo9
ia muito bem até surgir aquele cheiro de adeus distante...
Sem graça o palhaço cai, todo mundo cai de rir,
mas ninguém sabe que é porque soltaram os leões!
Pássaro sem asa, bico fincado no chão, era
Sebastião indo pra guerra...
Guerra de balões no céu!
(Seu
Sebastião): - Preocupe não,
já sou Capitão!
Perigo eu mato
no grito ou não me chamo Sebastião!
(Tio
daqui): - Quanto tempo
ficará longe do menino e de Dona Chica? Me diga!
(Tio
de lá): - E se não voltar?
E se não voltar como fica a família?
Fruta sem água caiu do galho no chão, era
Sebastião indo pra guerra...
Guerra de gigantes no céu!
(Seu
Sebastião): - Preocupe não,
voltarei em breve!
E o que será
da morte se eu disser que não, não e não?
Homem sem casa, vida levada em vão, era
Sebastião indo pra guerra.
Guerra de grandes poetas no céu!
(Seu
Sebastião): - Para10
a batalha levarei meu chá e meus soldadinhos de chumbo que me consolam! Meu
Parangolé me protegerá contra as balas dos americanos que nos incomodam! Ei
Dona Chica, não vá se preocupar, sempre mandarei notícias da Gringolândia!
Dez balões remendados, nove soldadinhos magros,
um capitão desarmado, super-heróis desastrados.
E toda a cidade lá atrás acenando!
(A
Cidade): - Adeus! Adeus!
Adeus...
Carta de Seu Sebastião da guerra:
“Aos12
queridos Totó e Dona Chica: Paz e amor!
No escuro da
guerra, atingidos por um balão Americano vermelho, branco e azul...
Prisioneiro
que sou, suportarei toda dor!
Tentarão me
fazer falar, pois bem saberei me calar...
No calor dessa
guerra, dentre tantos feridos soldadinhos magros, aqui vos fala mais um...
Mas apesar dos
rumores, somos os vencedores!
Tentarão me
fazer chorar, pois bem saberei me segurar.”
Assinado: Seu Sebastião.
Vai13
balãozinho de São João, sobe e leve um beijo pra Sebastião!
(Totó): - Pai, volte logo da solidão, estamos como a
fome está para o pão!
(Tio
daqui): - Paizão se deus
quiser voltará da guerra são e salvo a chorar a vitória!
(Tio
de lá): - Sei não, trem que
é bão não trás má notícia!
(A
Empregada): - Atenção,
acode a bandeira!
E o maquinista entrou na sala e leu a nota:
(O
Maquinista): - Seu Sebastião
bateu as botas!
(Totó):
- Papai, não vá tão cedo,
que medo... papai não vá tão cedo, que medo...
Esse é o samba mais triste.
(O
Padre): - Capitão14,
para te velar também vieram: Iáiá, Silas, Valdemar, Enos,
Bebé, Seu Zé
Canarinho, Seu Quis, Seu Veludo. Veio Seu Dito do Leite, Ivo, Carminha,
Onofre &
Amélia, Mulero & Nezica.
(Seu
Veludo, o Pasteleiro): -
Sagrada15 fé cura!
(Zé
Canarinho, o Barbeiro): -
Sagrada fé mostra!
Vai vivendo mãe sem marido e filho sem pai.
Vida simples, arroz com feijão.
(Seu
Dirceu, o Sorveteiro): -
Sagrada fé sempre!
(Seu
Quis, o Inventor): -
Sagrada fé forte!
Vai vivendo subindo a ladeira do cemitério,
viuvinha. Flores na mão.
(Dona
Chica): - Boa morte! Voa
anjo!
Andar a pé, pedra!
Andar a pé, espinho!
Vai vivendo toda beleza dia-a-dia!
Molequinho, bola no pé!
(Dona
Chica): - Boa sorte! Voa
anjo!
FOLHA DE HORTELÃ
Assim1 é. Depois de só cair, cadê?
Quiçá você.
Assim é. Depois de não caber chorar, caber
você.
Assim é. Querer deitar, dormir, te ver, sonhar
você.
Assim é e2 foi em meu mais alto vôo
no balanço de pneu.
Sobre o muro da vizinha vi ali você: Valentina!
Tava frio, tava manso, branco junho de descanso.
Um belo tombo do balanço pega o braço e quebra
o osso!
Quebrei o braço mas eu vi na altura do não ver,
a menina ali descalça, vestidinho a correr!
Veio avô, veio tia, veio também quem eu queria,
a priminha da vizinha: pequenina Valentina.
O teu nome em meu gesso: meu primeiro amor!
Teu olhar eu nunca esqueço.
(Totó): - Todas minhas dores viram flores!
Fruta doce, laranjeira de ensinar brincadeira.
Mais um riso, lindo dente e bigode de leite.
(Totó): - Me dê a mão pra eu te levar até minhas amigas
e amigos, rodaremos em ciranda até a noite de domingo! Faço desaniversário,
tenho algo a oferecer, tive meu melhor inverno e meu presente foi você.
Gira-gira3 até quebrar a ciranda e
machucar os joelhos.
Gira-gira de passar merthiolate, e se pensar
não arde.
Gira-gira só pra ficar do seu lado e segurar
teus dedos.
Gira-gira de bagunçar o cabelo e reparar teu
jeito.
Gira-gira segura forte a minha mão, não solte
mais: te amo!
Gira-gira de zunzun, de zanzar, de zonzar
zonzo.
Gira-gira de sem querer esbarrar, é quase lá,
lábio.
Gira-gira de tropeçar na vontade e perguntar. Posso?
Gira-gira abro o olho e lá vem ela me abraçar:
ímã.
Gira-gira de rodar sem parar de imaginar como
tudo4 ao meu redor fica leve quando
teu beijo bom se atreve.
Uhhhhhhh! Eu e ela! Na piscina do quintal, na
varanda, sob o pé de romã!
(A
turma): - Adedanha,
ahhhhhhh: tá contigo!
(Dona
Chica): - Vem almoçar na
mesa! Vai esfriar o feijão!
(Totó): - Já enchi meu pandu com bolacha, picolé de
Itu e mini-saia!
(A
turma): - Traz mais um Seu
Dirceu sorveteiro.
(Dona
Chica): - Depois de almoçar
vê se não corre de jogar pedra em bicho que morde!
(A
turma): - Ahhhhhhh:
Marimbondo!
(Dona
Chica): - Vá se trocar pra
missa! E não enrole no banho!
(Totó): - Peraí, já já vou, espera o meu amor terminar
de explicar onde que picou.
Uhhhhhhh,
cotovelo!
Pena5 que a menina não more na
cidade, será que quando for embora saberei como agora?
Olho castanho, castanha infância, sardinha e
pele branca, linda na ciranda.
Meu Kichute furado, cadarço na canela, dançando
ao lado dela (palhaço da groselha).
Casquinha no joelho, o primeiro beijo, vermelho
é meu sangue, teu lábio é flamejante.
(Totó): - Deixo estar assim, leve feito chá que aquece
o peito de quem bebe pra melhorar.
Pena que você
não more na cidade, será que quando for embora saberei como agora eu sei? Do
cheiro da blusa, carinho na nuca, sorriso que cuida!
Estamos aqui, saudoso inverno.
(Totó): - Ela aperta minha mão no parquinho que é de
ferro-velho!
Tiro ao alvo e minhocão.
Roda-gigante, roda menina, roda bem vestida de
roupa e coração.
(Totó): - Deixo estar assim, leve feito chá que aquece
o peito de quem bebe pra melhorar.
Carta de Valentina para Totó:
“Guarde6
o coração, obrigada pelo beijo bom (que não volta mais). Juro que não sei
porque, sei que já não posso mais te ver pequenino. Sou linda donzela, sou do
mar, sou do ar. Forte e feminina de cair e levantar! Sou árvore pequena mas já
tenho sombra boa! Limpa pra beber, lisa de correr sou água limpa. Corro para o
mar, subo para o céu, caio onde o vento querer que eu caia! Caro amigo Totó,
estou partindo por agora pra bem longe. Obrigada pelo céu, sinto muito pelo
‘não’ mas não dá, só te peço. O bêbado Amarelo beberá e cairá. Um santo branco
anjo descerá pra lhe ajudar...”
Assinado: Valentina.
(Totó): - Valentina7 foi-se embora e não
pude perceber...
Se ao menos eu
soubesse teria vindo aqui pra ver!
Valentina escova os dentes com maçã.
(Totó): - Tudo agora diferente na varanda sem você...
Algo estranho
acontece, será que vou me esquecer?
Valentina escova os dentes com maçã.
Tangerina na mochila de manhã.
(Totó): - Se a vida assim me pede, já não posso mais
ceder...
Tentarei olhar
pra frente e aceitar o que vai ser!
Valentina escova os dentes com maçã.
Tangerina na mochila de manhã.
Argentina de bandeira e coração.
(Totó): - Amanhã8 de manhã ao levantar irei
recomeçar sem Valentina...
Amanhã de
manhã ao levantar irei chamar todos os heróis, a turma da rua.
Iremos caçar o
Boi-da-Cara-Preta e o Úrso-Mole do Julio Cortázar e cada qual irá com sua
bicicleta branca levando uma arma de fazer “pinhar-pinhar!”
Mas pra encontrar bichos tão caros de imaginar
não há de ser fácil,
pois pra chegar lá é preciso atravessar o
quarteirão
por dentro das casas de sagrados quintais
protegidos,
cheios de calma.
(Totó): - Amanhã de manhã ao levantar contemplarei os
caramujos e o lodo nas pedras.
Observar miniaturas no chão de terra pra
ampliar minha cabeça.
(Totó): - Amanhã de manhã ao levantar, saltarei
naquele sonho das crianças do mundo de balançar em colos seguros, lugares
perfeitos de acreditar na vida sem medo.
E9 levantei, e aproveitei pra
brincar em ruas de grama.
E acordei com entusiasmo pra escalar goiabeira.
Hoje faço meu inventário pra guardar memórias
raras:
“Tampinha da laranja / semente de romã / bicho
da goiaba / folha de hortelã / câmaras de ar /
bóias pra nadar / cloro no cabelo / sunga pra
pular / ferrão de marimbondo / ralo da piscina / moleque tão briguento me
esperando na esquina / Liga da Justiça / Caverna do Dragão /
Onde está Wally? / Comandos em Ação / lápis e
borracha / papel e giz de cera /
cheiro da escola guardado na lancheira / jogo
de botão / bola de capotão / futebol na pracinha /
time do Negão / cheiro de naná / vermelho
embornal / cortina do Pinóquio / crochê da Vó Sinhá / pote de arnica serrote do porão / passarinho colorido que
muda de estação /
escuro do meu quarto / medo do palhaço / entro
mas não vejo um nó no meu cadarço /
sacolas estampadas / na hora do almoço / no
mercadão antigo cada passo um cheiro novo /
alçapão de pombo feito com um balde preto /
barbante que estica até a janela do banheiro /
banco de cimento / colo de Anita / azulejo de
alpendre / coração de Dona Chica.”
De10 onde vim é tudo o que sou. Opa!
E pra celebrar tudo o que vi no quintal que me
criou, andei, pensei e parei, já sei!
Contar histórias: verdade!
Banho de rio, Minas Gerais, oba!
E pra experimentar mais uma vez tudo o que me
ensinou, andei, pensei e parei, já sei!
Guardar memórias: saudade!
Cantar a terra natal: lealdade!
Longe11 da cidade, casinha lá detrás
do monte.
Roça pequenina do Vô José!
Todos os ouvidos atentos pra mais uma história!
(Totó): - Conte-nos aquela que reza assim:
“Velho Boiadeiro em seu alazão...”
(Vô
Zé): - “É muito ruim de
mira, com sua espingarda velha erra até elefante!
É herói
farsante mas é o rei da sorte: sempre ganha da morte!”
Quem contava era Vô Zé!
Cheiro de pamonha, doce rapadura mole, suco de
mangaba da Vó Sinhá.
(Totó): - Só mais um sorvete, só mais uma história
boa, conte-nos aquela que reza assim...
(Vô
Zé): - “Dona Helena vai,
deixa eu te cuidar linda rosa! Dona Helena lá e eu cá, boiadeiro de mãos
machucadas, trabalhador solitário! Dona Helena vai, deixa eu te cantar bossa
nova...”
Abram as cortinas, mexam as barrigas em
lágrimas de riso que é choro bom!
(Vô
Zé): - “Velho Boiadeiro,
grande coração!
Luta pela
amada e enfrenta o inimigo mal cara-à-cara com a morte!
Um tiro pela
culatra raspa a mamangava que voa e pica o bandido bem na garganta!
Quem contava era Vô Zé, tão nobre Vô Zé sentado12
em seu trono de descanso, escravo do cochilo.
Sob a sombra das histórias, sob a sombra dos
meninos.
No reino lá da roça tinha pé de bananeira,
folha grande, folha forte sempre foi nossa bandeira.
Mas13 acabou a roça do Vô! O homem
de terno comprou!
(Homem
de terno): - Quanto custa a
esperança? Quanto vale o amor?
Olá
homenzinho, chore teu destino! Sofra!
Derrubou as bananeiras, o homem que colocou
cinco colheres de açúcar sem pedir por favor!
Rabiscou14 a infância. Apagou
lembranças.
Levou meus brinquedos! Machucou meus dedos!
(Totó): - Uhhhhhhh, tenha dó! Devolve minha casa!
Desliguei do mundo pra dentro do umbigo.
(Totó): - Uhhhhhhh, tenha dó! Devolve minha casa!
Bilhete para a infância:
“Se15
vai voltar, já nem sei mais, e dói e como! Quem puder estar lá, preze por ela.
Hoje se
dissolve em mim, você meus acordes: olé na tristeza!
Infância, não
vá! Não bem agora.
Criança do
bem, fiquei contente em te ver!
Hoje se
dissolve em mim, você meus melhores dias de seguir...
Ainda hoje...
Dale, dale,
dale toda fé.
De manhã bem
cedo mães beijam seus filhos.
Dale, dale,
dale um belo som.
De manhã bem
cedo anjos tocam seus sinos.
Ainda hoje teu
aceno tão longe... Ainda hoje, despedida tão forte!
Na minha alma
teu abraço realengo...
Na minha
alma... na minha alma... na minha alma...”
Assinado: Totó
FIM
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Meu irmão, Parabéns!
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